Estudo para superfície e linha
(CCBB, 2005)
Chama a atenção nesses “estudos de espaço” a configuração arquitetônica em que a artista acabou por dissolver a escultura. Não pode passar despercebido, afinal, o fato de o trabalho não surgir tanto como o conjunto de objetos (“esculturas”?) que o constituem, mas antes feito um acontecimento único, todos esses objetos tendo seus contornos embaçados, relativizados em justaposições sucessivas, revelando-se descarnados e potencializados a um rol mínimo de elementos estruturais. Os objetos, então, em vez de se adicionarem ao espaço, como normalmente fazem as esculturas, nele se dissipam, transformando num campo de forças que se faz sentir para além da objetividade empírica que cada um deles carrega. O que se tem agora, mais do que uma série quantificável de eventuais esculturas, é um complexo de superfícies de policarbonato e linhas tubulares que se retesam ou descomprimem em gordos arqueamentos, num trânsito frenético entre uma infinidade de experiências psicossensoriais: interior e exterior, leve e pesado, denso e fluido, contínuo e descontínuo.
Segundo Sonia Salzstein, o trabalho sugere, dessa maneira, uma arquitetura “mole” e translúcida, a se desenvolver sem cerimônia por dentro da arquitetura sólida do prédio ou, mais precisamente, a deshierarquizar o que esta estabelece como um “aqui” interior e a exterioridade que se desdobraria para além de suas paredes, “lá fora”, no ambiente da “cidade”. Diferentemente da natureza institucional e material daquela, a arquitetura efêmera e ambulante do trabalho, pensada no horizonte da utopia de um corpo dotado de inesgotável plasticidade e capaz de transitar sem solução de continuidade entre o intimismo do gesto e a impessoalidade do design, embaralha e comuta livremente o acaso e o planejamento, o próximo e o distante, o interno e o externo, obedecendo às suas próprias leis de funcionamento, revolvendo e transtornando os modos de uso de toda arquitetura, embora em negociações cerradas e pontuais com ela, seja qual for tal arquitetura.

Vistas da exposição Estudo para superfície e linha realizada no CCBB em 2009.
Fotos: Sergio Araujo.
×


